Esta semana a Marvel divulgou que o estúdio conseguiu bater, com Vingadores: Ultimato, a marca de Avatar como maior bilheteria da história, arrecadando 2,789 bilhões de dólares com a exibição do filme. Diante disso, a questão que fica é: como um estúdio que estava à beira da falência conseguiu se redefinir em apenas uma década e lançar, desde então, 22 filmes que arrecadaram um total de 17 bilhões de dólares?
De acordo com Kevin Feige, head da Marvel Studios, o segredo estaria no equilíbrio entre criar filmes inovadores que retenham continuidade suficiente para mantê-los identificáveis pelo público como parte de uma mesma família.
E como eles conseguiram unir continuidade e inovação com tanto sucesso? Através dos princípios a seguir, compilados e publicados pela Harvard Business Review:
1. Diversidade
Dos 15 diretores contratados pela Marvel, apenas um tinha experiência no gênero de super-heróis, enquanto a dos demais variava entre Shakespeare, filmes de terror, espionagem à comédia. Essa diversidade de experiências trouxe uma visão única para cada um dos filmes, em Thor: O Mundo Sombrio há conotações shakespearianas; em Homem Formigaconotações de um filme de assalto; Capitão América: O Soldado Invernal é um filme de espionagem; enquanto Guardiões da Galáxia poderia ser caracterizada como uma ópera espacial alucinante.
Uma das apostas do estúdio que mais se destaca é a do seu primeiro filme, Homem de Ferro, que teve Jon Favreau como diretor e Robert Downey Jr. como ator principal. Favreau veio da cena indie, foi escolhido por sua habilidade de construir personagens interessantes e bons diálogos. Até então, havia produzido apenas filmes muito pequenos, mas aclamados pela crítica. Já Downey Jr., ao mesmo tempo em que era conhecido por suas habilidades como ator, tinha um amplo e divulgado histórico de abuso de drogas, motivo pelo qual nunca havia sido convidado para protagonizar um filme. A improvável combinação da experiência desses dois artistas resultou na caracterização do famoso Tony Stark.
2. Alavancagem
Para conseguir equilibrar tantas novas ideias, vozes e talentos, a Marvel mantém um “núcleo” de alavancagem, uma pequena parcela de profissionais que permanecem nas produções de um filme para o outro. Desta forma, conseguem manter a continuidade dos filmes ao mesmo tempo que trabalham com uma comunidade de novos talentos.
Além disso, o estúdio garante tanto para diretores quanto para atores autonomia nas produções, algo bastante atrativo para grandes nomes da indústria cinematográfica. Em entrevistas, Scarlett Johansson e Benedict Cumberbatch, por exemplo, chegaram a dizer que se sentiam “à vontade” e “empoderados” para fazer “o que queriam” com relação à construção de seus personagens, de um jeito interessante e cheio de nuances.
3. Fórmula
Os diretores da Marvel não se apegam a fórmulas que um dia geraram produtos de sucesso, pelo contrário, desfazem-se delas e vão em busca de novos ingredientes. Os scripts da Marvel revelam que os filmes trazem desde notas emocionais a notas visuais diferentes, e foram justamente os filmes que não se ativeram ao gênero de super-heróis que fizeram mais sucesso, como Homem de Ferro, Guardiões da Galáxia, Doutor Estranho, Homem Aranha: de volta ao lar e Pantera Negra, em contrapartida a Hulk, por exemplo, que foi mantido no antigo molde. No fim, o desapego às fórmulas tornou-se uma característica da própria Marvel, a tal ponto que os fãs vão ao cinema já esperando ver algo diferente.
4. Curiosidade
A Marvel cultiva a curiosidade da audiência ouvindo a opinião dos fãs; adicionando pequenas surpresas nos filmes que sugerem uma futura produção; e inserem referências a outros filmes, estejam eles dentro ou fora do universo da Marvel.
Fora do Universo Cinematográfico da Marvel, algumas empresas utilizam-se de artifícios criativos similares para alcançar melhores resultados e um melhor posicionamento no mercado. Empresas de energia elétrica, por exemplo, contratam meteorologistas que os auxiliam em soluções para energia sustentável; e fundos de hedge têm contratado jogadores de xadrez por sua destacada habilidade de reconhecimento de padrões.
Para uma melhor compreensão, vamos entrar em exemplos mais específicos:
A empresa de tecnologia Outfit7, criadora do famoso gatinho Talking Tom, quando nomeou o jovem Žiga Vavpotič como seu novo presidente sabia que ele nunca havia feito o download de um jogo em seu computador em toda a sua vida, sua expertise estava em trabalhos com ONGs e empreendedorismo social. O objetivo era focar nos processos de expansão da organização, sem que sofresse interferência dos debates sobre tecnologia. Funcionou. São pouquíssimas as companhias preparadas para fazer esse tipo de aposta.
Nestlé e 3M, por sua vez, mantêm uma clássica estrutura organizacional, mas entendem a importância que as redes de relacionamento possuem para garantir evolução, inovação, dinamismo e flexibilidade. Por isso, novos membros estão sempre sendo agregados a seus times, desta forma, conseguem garantir continuidade e gerar inovação mantendo sua estrutura quase intacta.
Já a Nike, com sua marca Jordan, gera curiosidade nos consumidores inserindo recursos ocultos em cada uma das versões de seus sapatos, que variam de escrita em braile na língua a citações gravadas à laser na sola dos tênis. Assim como a Marvel, ela conecta seus produtos através de detalhes e possui uma ampla rede de consumidores online que fornece constante feedback sobre eles.
As abordagens adotadas pela maioria das organizações para sustentar a criatividade e inovação de seus produtos costumam ser seguir processos ou construir uma cultura nesse sentido. Porém, é necessário atentar-se para o fato que apesar de útil, a continuidade de um produto de sucesso acaba sofrendo restrições em muitos contextos. A atenção aos princípios elencados acima, como um todo, pode ajudar as organizações a irem além dessas restrições, construindo um mecanismo de inovação que seja sustentável a longo prazo.