O que realmente nos torna resilientes?

Catorze anos atrás minha mãe foi diagnosticada com câncer de mama, doença que aflige e rouba a vida de muitas pessoas, principalmente mulheres, em todo o mundo. Ela tinha acabado de completar 50 anos e o meu irmão caçula, 11.

Lembro-me que, na época, tínhamos uma viagem de família marcada para o mês de julho. O diagnóstico foi realizado um mês antes. Ela guardou essa informação só para ela e viajou antes de iniciar seu tratamento como se nada tivesse acontecido.

Como ela conseguiu transparecer aquela plenitude, o tempo todo, durante 15 dias, eu até hoje não sei. E confesso que não consigo imaginar o medo, o desespero e a dor que ela sentiu por ter que enfrentar a situação sozinha, a fim de poupar o bem-estar de 5 filhos – 3 deles menores de idade – e um marido que ficava a semana toda fora de casa à trabalho.

Essa parte da história de vida da minha mãe é apenas um exemplo do que me faz refletir sobre a resiliência. Ela fez uma cirurgia, passou muito mal durante todo o período de quimioterapia, enfrentou um longo percurso de radioterapia, se “virou nos 30” com filhos pequenos e marido ausente, usou peruca por muito tempo e hoje está mais saudável e feliz do que nunca!

E então eu penso, será que todos nós temos essas reservas de força e tolerância? Quem dera se todos pudéssemos nos recuperar de todos os desafios mais fortes do que nunca!

O que é, afinal, a resiliência? Como podemos cultivá-la em nossas próprias vidas?   

 

Imagem de brett-jordan via Unsplash

 

Em minha busca por respostas, encontrei 2 estudos realizados pelo pesquisador Marcus Buckingham e sua equipe do ADP Research Institute que demonstram que os níveis de resiliência não possuem qualquer ligação com gênero, idade, etnia ou nacionalidade, e têm 2 alavancas primárias que chegam a ser contraintuitivas:

1 – A resiliência é um estado de espírito causo pela exposição ao sofrimento.

Considerando como exemplo o cenário de pandemia, Buckingham afirmou que não importa quão eficaz determinado país tenha sido em sua resposta a ela, o que impulsionou os níveis de resiliência das pessoas foi o quão intimamente elas estiveram expostas à doença. Em outras palavras, isso sugere que descobrimos nossa resiliência quando somos obrigados a enfrentar um sofrimento inevitável.

2 – Quanto mais tangível a ameaça, mais resilientes nos tornamos.

Quanto maior o número de mudanças que somos forçados a absorver, mais convencidos ficamos de que elas serão permanentes, e mais a nossa resiliência aumenta.

Percebemos o quão resilientes podemos ser quando enfrentamos a realidade e somos capazes de enxergar quem nós realmente somos através da forma como respondemos a ela. Por mais incongruente que possa parecer, o que é real – quase sempre – é menos assustador do que o que é imaginado, por isso a realidade de uma doença ou de um desemprego acabam atuando como agentes fortalecedores, porque nos ajudam a compreender do que somos capazes.

Nós, humanos, não funcionamos bem quando somos privados da realidade. É mais prejudicial para a nossa saúde mental amenizar, subestimar ou ignorar realidades difíceis, porque acabamos permitindo que a nossa imaginação – que é bastante fértil – voe solta e descoordenada como folhas ao vento.

Além disso, esse tipo de atitude não contribui com o controle ou redução do nosso medo e ansiedade, ao contrário, nos impede de projetar formas saudáveis de lidar com os reveses, aumentando as emoções negativas.

O psicólogo Viktor Frankl, autor do maravilhoso livro “Em busca de sentido”, já dizia na década de 1930:

“Nossa resposta ao sofrimento inevitável é uma das fontes primárias de significado, propósito e autoeficácia em nossas vidas. O sofrimento e a dificuldade nunca devem ser escondidos de nós. Ao invés disso, mostre-os com honestidade e clareza e revelaremos – para nós mesmos e para você – nossa maior força”.

Não tem como ser mais claro e objetivo do que isso sobre um assunto tão complexo!

A espera nos apavora, mas quando sabemos o que iremos enfrentar, podemos avaliar e entender a melhor forma de viver diante de tais circunstâncias. Minha mãe conseguiu fazer uma viagem de vários dias carregando o peso de sua doença porque tinha um diagnóstico concreto e sabia quais seriam os próximos passos que teria que dar no combate à doença assim que retornasse.

E, por mais difícil que seja, isso nos dá a chance de viver com as melhores condições que temos naquele momento, nos dá resiliência!

Os resultados das pesquisas sugerem que essa teoria não se aplica apenas à casos como os de minha mãe, mas também a você e a mim, independentemente da mudança pela qual esteja passando.

Quando eu era criança, os adultos costumavam falar sobre o “homem do saco” para assustar crianças desobedientes, dizendo que ele as levaria para longe de seus lares. Esse “homem” sequer tinha um rosto para nós, mas o imaginário nos assombrava.

É o desconhecido que nos assusta!

A coragem de encarar a verdade e enfrentar a realidade – não a sua realidade – pode ser uma inesgotável fonte de resiliência!

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